Favelas Do Brasil Ao Longo Dos Anos E Politicas De Titulação 1888-Presente (Portuguese)

Favelas Do Brasil Ao Longo Dos Anos E Politicas De Titulação 1888-Presente (Portuguese)

Introdução:

 

Este artigo tem como objetivo aprofundar a economia informal brasileira. O Brasil é um grande país com uma população significativa de mais de 200 milhões de cidadãos. Na segunda maior cidade do Brasil, o Rio de Janeiro, 24% da população vive em assentamentos informais chamados “favelas”. 60 por cento de toda a população do Brasil trabalha na economia informal de acordo com O globo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IGBE). Essas são estatísticas significativas para uma economia classificada como a 9ª maior do mundo, à frente de países como Canadá, Espanha e Coréia do Sul. A quantidade de ativos informais que ainda não foram colocados no mercado no Brasil e sua classificação como um “mercado emergente” com sua classificação como uma das 10 maiores economias em termos de PIB torna o Brasil um caso interessante de se analisar. Ao longo deste artigo, aprofundaremos os assentamentos informais no Brasil para entender como esses espaços foram inicialmente estabelecidos, examinaremos intelectuais relevantes e seus pensamentos sobre direitos de propriedade, instituições de mercado e economias informais.

 

  

História dos assentamentos informais no Brasil: 

 

Para entender esses assentamentos informais de forma mais abrangente, é importante considerar o que levou uma quantidade tão grande de pessoas a viver nesses espaços informais e, a economia informal nas maiores cidades brasileiras do Rio e São Paulo. Para isso, temos que partir da história do Brasil durante o tráfico de escravos.

Assentamentos informais: 1530-1888

Os africanos ocidentais foram trazidos para o Brasil de 1530 a 1888. Durante esses três séculos, o Brasil recebeu 4 milhões de africanos do tráfico de escravos, mais de quatro vezes mais do que qualquer outro destino americano. Comparativamente, o Brasil recebeu 40% do total de africanos trazidos para as Américas, enquanto os EUA receberam aproximadamente 10% (Arsenault, 2003). O Brasil tem a 2ª maior população africana do mundo, atrás apenas da Nigéria. Perceptivamente, esta é uma estatística interessante, pois a ascendência africana na América Latina é frequentemente negligenciada. O Brasil (o maior país da América Latina) claramente rompe com essas percepções hegemônicas da demografia e da composição racial da região. A importação massiva de mão de obra escrava africana seria usada para trabalhar em campos de diamantes, minas de ouro e plantações de açúcar e algodão. Muitos seriam trazidos para São Paulo, a maior cidade do Brasil, assim como o Rio de Janeiro, a 2ª maior cidade do Brasil e Salvador, uma cidade significativa por direito próprio. Em 13 de maio de 1888 seria aprovada a Lei Áurea (Lei Áurea) que libertaria milhões de afro-brasileiros anteriormente escravizados. Após a abolição, não houve preocupação em apoiar os recém-libertados em termos de compensação, direito à terra, dinheiro ou oportunidades de trabalho. Os brasileiros anteriormente escravizados foram deixados para sobreviver em seus próprios termos. Antes da emancipação em 1888, os afro-brasileiros resistiam ativamente à escravização e comumente corriam para assentamentos rurais longe da plantação. Alguns desses primeiros assentamentos foram estabelecidos nos morros do Rio. Após a emancipação, esses assentamentos continuariam a crescer nos grandes centros urbanos na esperança de encontrar oportunidades de trabalho mal remunerado. A transição do trabalho forçado para o trabalho livre foi difícil. As ideologias raciais ainda eram difundidas na sociedade brasileira. Os portugueses brasileiros viam os negros como indolentes e naturalmente servis. Os afrodescendentes, agora libertados, frequentemente não eram contratados quando a mão-de-obra era necessária (Quintão, 2019). Embora a discriminação fosse desenfreada, os afro-brasileiros libertos continuaram a se estabelecer em favelas urbanas nas principais cidades do Rio e de São Paulo. Essas novas comunidades informais receberam relativa autonomia. O governo brasileiro não tinha orçamento para criar moradias para milhões de pessoas recém-libertadas e os assentamentos informais foram inicialmente vistos como uma solução para a crise habitacional que ainda é generalizada.

  

1930-1950:

 

Não seria até as décadas de 1930-1940, durante a ascensão do governo populista de Vargas, que as favelas seriam centralizadas para a urbanização e regularização. Getúlio Vargas chegou ao poder na década de 1940, quando o partido comunista ganhava força na política brasileira. Para impedir a ascensão do partido comunista, Vargas reprimiria supostos membros do partido comunista e outros adversários políticos de esquerda de seus governos. Além disso, como forma de cooptar os movimentos de esquerda nas favelas urbanas e obter mais apoio político, Vargas concentrou-se na modernização dos sistemas educacionais nas áreas urbanas e na ampliação da habitação social para os pobres. (Gomes, 1999). Essa era uma postura diferente de outros membros do gabinete de Vargas que acreditavam na demolição completa das comunidades informais. Vargas acreditava que a demolição apenas desestabilizaria essas comunidades e levaria à reconstrução de mais favelas em uma nova área. Em vez de demolição, Vargas acreditava que a construção lenta de espaços alternativos seria uma alternativa saudável. A construção desses novos espaços de vida se daria nos “Parques Proletários” em 1941. Os Parques Proletários eram assentamentos temporários construídos para reassentamento de 10.000 favelandos. Embora houvesse mais de 200.000 moradores de favelas no Rio na época, essa pequena iniciativa mostrou uma nova relação entre os pobres urbanos e o governo brasileiro em termos de ação pública. Embora os “Parques do Proletariado” fossem projetos ambiciosos, eles nunca se concretizaram para acomodar a significativa população de comunidades informais. O projeto de Vargas terminaria em 1945 e a década de 1960 traria novas políticas para os assentamentos informais do Rio.

 

 

Assentamentos informais: 1961-1985  

 

 

Em 1961 John F. Kennedy e o governo brasileiro assinariam a Aliança para o Progresso para promover a reforma social em toda a região da América Latina. Os Estados Unidos viram a crescente popularidade do partido comunista no Rio, com membros do partido comunista vencendo as eleições locais anteriores. A habitação urbana não era apenas uma questão de desenvolvimento nos espaços urbanos do Rio, mas também uma forma de as comunidades marginalizadas serem incorporadas a um sistema de mercado e a uma política moderada na época da Guerra Fria. A Aliança para o Progresso construiria habitações sociais de baixo custo com agências bilaterais e multilaterais de desenvolvimento sob a supervisão do governador Lacendra (Rios, 1974). A assistência externa para abrigar os pobres no Rio foram importantes ações de política externa para promover a estabilidade no maior país da América Latina. A casa própria estava no centro do projeto para integrar o morador da favela tanto na política quanto na sociedade. O governo estimou que a maioria das pessoas que vivem em favelas tinha condições financeiras para comprar sua própria casa em parcelas mensais, distribuindo entre 15 e 18 (mas não excedendo 25) por cento de seu salário mínimo. O vice-governador da Guanabara, Rafael de Almeida Magalhães, chegou a sugerir que esse era o valor que as pessoas pagavam por um barraco no morro no mercado informal. A regra geral era que a renda familiar deveria ser igual a 25% do salário mínimo, ou seja, uma família de quatro pessoas tinha que ganhar pelo menos um salário mínimo, uma família de cinco pelo menos um e um quarto de salário mínimo. O plano previa que em dez anos os novos moradores pagariam a urbanização, a construção e os custos financeiros, tornando-se o dono da casa. As parcelas deveriam ser indexadas à inflação para evitar especulações ou redução do valor dos empréstimos devido à imprevisibilidade do mercado imobiliário. Não foi necessário adiantamento. A propriedade, portanto, era a chave. Como o governador Lacerda colocou sem rodeios anos depois: “Não vamos dar nada de graça, exceto [para] os miseráveis, os indigentes. Os pobres sempre podem pagar alguma coisa, ao alcance de sua pobreza. . . esses moradores de favelas podem ter perdido a esperança. . . mas podem ter certeza de que não perderam a vergonha. . . não querendo abrir mão de sua liberdade e honra.” A liberdade e a honra dos pobres, segundo Lacerda, estavam moralmente ligadas à casa própria (Benmergui, 2018). A construção de vilas habitacionais foi o aspecto mais importante do programa em termos de escala e recursos empregados. Em junho de 1962, a USAID concedeu o primeiro empréstimo em moeda local (cerca de US$ 1,6 milhão) para a construção de Vila Aliança e Vila Esperança. A operação previa compra de terrenos, aterros e terraplenagem, urbanização, construção de casas e equipamentos comunitários, erradicação e realocação de favelas e fiscalização dos novos bairros. O custo do terreno foi fundamental para determinar a localização do projeto liderado pelos EUA. (Benmergui, 2018). Os EUA obrigaram o Estado da Guanabara a criar uma empresa de habitação para financiar esses projetos com capital privado e público, que se chamaria Companhia de Habitação Popular (COHAB). O projeto transnacional era um sistema de trabalho dividido, arquitetos locais projetariam os edifícios enquanto funcionários da USAID supervisionavam e aprovavam os planos. Os desenhos dessas novas vilas contrastavam muito com a vibração das favelas. Todas as vilas eram monótonas e repetitivas com desenhos semelhantes, enquanto as favelas vizinhas eram únicas com sua própria arquitetura individual. Embora o projeto inicial da COHAB e da USAID fosse fornecer moradia, os projetos deslocaram faixas de comunidades informais no processo. De 1962 a 1967, a COHAB deslocou 8.078 famílias, quase 42.000 moradores de favelas de mais de trinta e duas favelas, desde pequenos assentamentos com poucos barracos até favelas densamente povoadas, como Pasmado ou Esqueleto. O processo de erradicação envolveu várias etapas antes da realocação final para as vilas ou moradias temporárias. Em alguns casos a operação foi relativamente calma, mas em outros casos os moradores resistiram. A força policial e o uso de táticas coercitivas adicionaram violência a um programa habitacional já difícil (Benmergui, 2018). Um caso bem documentado desses processos de erradicação de favelas foi o caso da Favela do Esqueleto, uma favela no Brasil cujos moradores foram realocados para a Vila Kennedy, projetada e construída sob a COHAB. A Favela do Esqueleto estava localizada no Rio ao lado do Estádio do Maracanã, o maior estádio esportivo do Brasil, o estádio oferecia trabalho para favelandos locais, bem como oportunidades de comércio informal fora do estádio. A COHAB disse que a favela teve que ser destruída por causa de “preocupações com a saúde pública” ' algumas semanas depois a favela foi completamente erradicada. Este foi um exemplo de investidores trabalhando com a empresa local COHAB, pois a favela estava em um local altamente desejável para investidores imobiliários.

Enquanto alguns favelados foram forçados a essas novas estruturas, muitos favelados de classe média baixa buscaram essas novas vilas que deveriam ser para populações-alvo. O clientelismo era um grande problema no governo de Lacendra, com funcionários da COHAB recebendo propinas e favores pessoais de cidadãos cariocas mais ricos e conectados. Esse processo de erradicação das favelas continuaria ao longo dos 20 anos da ditadura militar (1964-1985). A erradicação tornou-se cada vez mais violenta sob a ditadura conservadora. Esse programa de deslocamento de favelandos em áreas de alto valor favoreceria as construtoras e um novo mercado imobiliário nessas antigas favelas. As remoções deslocariam 150.000 favelandos e agravariam a já precária situação habitacional no Brasil.

 

Década de 1990:

 

O retorno da democracia no final da década de 1980 restabeleceria o poder local aos municípios para formar suas próprias leis habitacionais e políticas sociais sob a Constituição de 1988. Em contraste com o programa massivo de erradicação e deslocamento da ditadura, a década de 1990 traria um novo programa chamado Favela Bairro. O programa Favela Bairro não buscava a erradicação das favelas, ao contrário, o programa buscava regularizar os assentamentos existentes de favelandos por meio da melhoria da infraestrutura. O Programa foi elaborado pelo GEAP (Grupo Executivo de Assentamentos Populares) composto por representantes de todos os órgãos municipais. Os principais objetivos do programa eram melhorar as condições de vida da população da cidade do Rio de Janeiro e integrar as favelas ao resto da cidade (Governo do Rio de Janeiro, 1994). Mais especificamente, o programa busca (1) fornecer às favelas serviços de saneamento básico em padrões aceitáveis ​​que possam ser mantidos oficialmente por agências governamentais, (2) reordenar espacialmente as favelas conectando suas ruas às ruas vizinhas da cidade e criando áreas de convivência coletiva. (3) prestação de serviços sociais destinados a diversos segmentos da população de baixa renda e (4) legalização da posse da terra (Raias, 1995) Grande parte dos recursos fornecidos foram provenientes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Os projetos incluíram tratamento de esgoto, caixas d'água, energia elétrica e pavimentação de ruas. Também foram construídos novos conjuntos habitacionais, parques comunitários, áreas de lazer e centros para crianças que vivem nas favelas. Embora esses programas tenham sido um sucesso na década de 1990 e início de 2000 nos últimos 10 anos, como resultado de profundas recessões econômicas, esses programas desaceleraram e os projetos anteriores de modernização do saneamento não foram bem mantidos.

 

Casos de Políticas Contemporâneas: 

 

Embora essas políticas anteriores tenham se concentrado na construção de moradias sociais para trazer os assentados informais para a economia de mercado, houve uma nova concentração na titulação e regularização de terras depois que Michel Temer assumiu o poder. Em 2017, o presidente Michel Temer aprovou a legislação 759 que reduziu significativamente o custo de regularização de propriedades informais para favelados, a medida também simplificou o processo para que moradores informais pudessem titular várias propriedades. Sob Jair Bolsonaro, esse esforço por titulação e privatização continuou. Bolsonaro, ex-capitão do Exército e apoiador da antiga ditadura militar, reforçou as políticas de erradicação durante a ditadura que desalojou milhares de favelados. Bolsonaro reprimiu de maneira semelhante, deslocando muitos moradores informais sem títulos com a ajuda da polícia militarizada. O déficit habitacional continua no Brasil e a principal política deste governo é uma política rígida de titulação e regularização. Embora a titulação tenha aumentado desde a legislação de Michel Temer, ainda há moradores da comunidade que hesitam em titular suas terras. A proposta política de titulação de terras informais foi prontamente popularizada por Hernando De Soto, economista e líder do Institute for Liberty and Democracy, um think tank que fornece experiência na incorporação de direitos de propriedade no mundo em desenvolvimento. De Soto acredita que criar uma capacidade institucional mais forte para titular propriedades e regularizar negócios na economia informal ajudará a reduzir a pobreza e aumentar a formação de capital. De Soto acredita que uma quantidade significativa de ativos no mundo em desenvolvimento está inativa. Ele calcula que há até 9,3 trilhões de dólares do que ele chama de “capital morto” ou ativos que não têm “energia” nos mercados porque não são devidamente titulados.

 

Em The Mystery of Capital: Why Capitalism Triumphs in the West and Fails Everywhere Else De Soto acredita que os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental se desenvolveram e continuam a florescer no sistema capitalista internacional por causa de suas instituições fortes e foco em proteger e limpar direitos de propriedade privada, bem como a capacidade de titular mais negócios e propriedades do que o mundo em desenvolvimento. Não só a titulação é importante em sua compreensão por razões de segurança e coesão social, mas a titulação também permite que indivíduos na economia informal tenham acesso ao crédito, esse acesso ao crédito permitirá às comunidades marginalizadas a capacidade de expandir seus negócios e, eventualmente, melhorar sua situação econômica . Aplicando DeSoto às Favelas: As ideias de Hernando De Soto atraíram atenção em todo o mundo em desenvolvimento e eu gostaria de situar suas ideias em nosso caso atual de deficiência habitacional brasileira e o aumento de favelas urbanas no Brasil. A escrita de De Soto está centrada no empoderamento de indivíduos que vivem na situação mais marginal e precária. Seu projeto central é diminuir a distorção entre a elite em países do Sul Global que têm grandes extensões de propriedade, acesso mais fácil ao mercado e mais acesso ao capital versus trabalhadores informais e membros de comunidades informais que estão negociando apenas com aqueles em proximidade com eles, dando-lhes uma menor capacidade de acumulação de capital (Tokman 1982). Embora eu ache que suas ideias podem ser úteis para reduzir a pobreza, se implementadas sem uma governança de mercado adequada e sem levar em conta fatores sociais, suas políticas podem ter um efeito inverso de aumento da pobreza. Dani Rodrik apoia esse ponto sobre políticas liberais de mercado sem governança adequada. “Economistas e formuladores de políticas aprenderam isso da maneira mais difícil durante o frenesi dos anos 1980-1990 sobre a liberalização do mercado. Liberar preços e remover restrições de mercado, muitos pensavam, seria suficiente para que os mercados funcionassem e alocassem recursos de forma eficiente. Mas todos os modelos de economia de mercado pressupõem a existência de várias instituições sociais, jurídicas e políticas... Onde esses fundamentos institucionais são inexistentes ou fracos, como em grande parte do mundo em desenvolvimento, a liberação... mercados não apenas não entregam os resultados esperados, mas mas também pode sair pela culatra” (Rodrik, 2015). No caso das Favelas no Rio, reduzir as barreiras de titulação e custo dá uma oportunidade maior para os favelandos sem economizar muito uma oportunidade de titulação mais rápida. Embora isso possa ser útil para os favelados sob ameaça de despejo de um regime linha-dura, também oferece mais oportunidades para investidores ricos comprarem comunidades públicas se essas políticas não forem bem governadas. As qualificações para titulação dessas terras públicas onde residem essas comunidades informais devem ser corretamente governadas por uma agência local que possa verificar se a terra pertence aos membros da comunidade. Sem essas proteções, os investidores que compram terras podem mostrar a compra de títulos e despejar os moradores informais. As críticas duras de Bolsonaro aos posseiros em terras recém-adquiridas tornam essas proteções cada vez mais importantes. Outra questão que ainda precisa ser aprofundada antes de implementar as ideias de De Soto são as parcerias “clienteladas” entre governos locais e interesses especiais. Durante a construção das vilas do COHAP, funcionários do governo receberam propinas para permitir a compra das propriedades recém-construídas que foram inicialmente criadas para favelandos deslocados. Isso também pode ocorrer em termos de privatização de terras comunitárias de favelados por empresas imobiliárias. Como foi observado por Vogel em seu livro Marketcraft: How Governments Make Markets Work “as empresas privadas podem buscar lucros de monopólio por meio de comportamento anticompetitivo no mercado, bem como pressionando o governo a favor” (Vogel, 2018).

 

A compra de títulos de terra caros por empresas imobiliárias elevaria os preços de mercado em uma área como o Rio nas favelas da Rocinha, consideradas muitas para ter a melhor vista do Brasil no país. O aumento da privatização e compra de títulos de terra por essas empresas aumentaria a especulação imobiliária que já é considerada alta nessas áreas urbanas. Acesso ao crédito da DeSoto: Deixando de lado o processo de titulação, a implementação das ideias de DeSoto sobre cidadãos informais que obtêm acesso ao crédito usando a terra como garantia também precisa de grande supervisão. De Soto assume que as empresas bancárias permitirão prontamente o acesso ao crédito assim que a terra e a habitação forem regularizadas. Embora isso possa ser verdade, os favelandos de baixa renda ainda são vistos como investimentos arriscados e a bola de neve da desigualdade de riqueza do Brasil é uma economia política difícil de navegar. A desigualdade financeira no Brasil é uma das mais altas do mundo, principalmente nas áreas urbanas do Brasil. Com os brancos ganhando quase o dobro do que um afro-brasileiro ganharia em termos de economia formal ou informal, segundo o IGBE, para cada US$ 1.000 que um brasileiro de ascendência europeia ganha, um afro-brasileiro ganha US$ 575 na economia formal ou informal em a mesma taxa. Essas desigualdades salariais são exasperadas pelo nível de educação e pela discriminação da força de trabalho que ainda está presente na sociedade brasileira. Da mesma forma, as desigualdades salariais também são encontradas nos EUA “A discriminação racial na contratação possibilita estratégias de negócios extrativistas que proporcionam salários, benefícios e segurança mais baixos aos trabalhadores de minorias. Isso contribui para a estratégia de baixo caminho de muitas empresas norte-americanas que favorece o corte de custos em vez de aumentar o valor” (Wilensky 2012, 155-90). Isso reforça a segregação ocupacional e perpetua a diferença salarial racial. Os afro-americanos (e mulheres) estão desproporcionalmente concentrados em ocupações de baixos salários, principalmente no varejo, serviços de alimentação e assistência médica domiciliar (Stiglitz 2016, 85). E um corpo considerável de pesquisa confirmou que os empregadores continuam a discriminar com base na raça (Bertrand e Mullainathan 2004; Pager, Western e Bonikowski 2009)”.

 

Isso aconteceu nos Estados Unidos antes da crise financeira de 2008 Vogel articula esse comportamento de busca de aluguel em seu artigo The Regulatory Roots of Inequality in America “(As empresas financeiras) também atacaram ativamente essas minorias por meio de credores do dia de pagamento que cobram taxas e juros exorbitantes cotações. Essa estratégia explodiu com a crise das hipotecas subprime, quando os bancos buscaram ativamente tomadores de empréstimos em comunidades minoritárias para que pudessem designar empréstimos como subprime e, assim, cobrar taxas de juros mais altas e obter retornos mais altos (Baradaran 2017, 234-40, 255-60). Políticas e práticas discriminatórias significam que os consumidores minoritários têm mais dificuldade em obter crédito; eles são mais propensos a serem vítimas de empréstimos predatórios; e pagam mais pelos serviços financeiros em geral” (Vogel, 2020). O caso dos EUA e o caso do Brasil nos dão algumas dicas sobre como empréstimos e desigualdades históricas podem exacerbar a desigualdade econômica. Embora eu acredite que De Soto tenha boas razões para expor seus pontos sobre a importância de ter um título seguro e ter acesso ao capital, se feito sem uma governança de mercado adequada, seu projeto de diminuir a pobreza pode aumentar e inversamente aumentar as disparidades de riqueza no mundo em desenvolvimento.

 

Conclusão:

 

O estabelecimento dessas comunidades informais remonta aos anos pós-emancipação de 1888. Sem governança adequada, as instituições de crédito que buscam renda podem atacar minorias de baixa renda que não negociaram com empresas financeiras antes. Uma vez que a governança de mercado e a supervisão institucional estejam presentes, incentivar ou orientar os favelados a ganhar títulos se torna o próximo passo para os formuladores de políticas. Por causa da história de vários programas de erradicação, pode ser difícil para os favelados aceitarem esses novos programas, especialmente sob regimes mais radicais.

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